João Bernardo Honwana, diretor da Divisão de África II do Departamento de Assuntos Políticos das Nações Unidas, em Nova Iorque, foi o orador convidado da mesa redonda subordinada ao tema “Preocupações de Segurança nas Áfricas Ocidental, Central e Oriental”, que decorreu no dia 26 de Junho na sede da Fundação AIP.

Este debate insere-se num ciclo organizado pelo IMVF em parceria com a Fundação AIP, o EuroDefense-Portugal e a AFCEA-Portugal, e cujo objetivo é aprofundar o conhecimento e a reflexão sobre várias dinâmicas políticas e de segurança que condicionam as decisões de investimento e a internacionalização da economia portuguesa.

Perante uma audiência constituída por empresários, académicos, diplomatas, membros de organismos públicos e da sociedade civil, João Bernando Honwana traçou os principais desafios que se colocam ao continente africano, principalmente no que respeita às dinâmicas políticas e de segurança.

Falando a propósito do Sahel, considerou que a ausência de nações consolidadas e um contexto político marcado pela corrupção, pela interferência dos militares no processo político e por processos pouco inclusivos de governação, em que a luta política se transforma na luta pela sobrevivência, são alguns dos problemas comuns a vários países africanos. Neste quadro, os partidos políticos não são forças integradoras da sociedade e as elites tendem a utilizar os instrumentos democráticos – como a realização de eleições – como ferramentas e exclusão e de acesso ao poder. Assim, processos que aparecem aos olhos da comunidade internacional como uma surpresa, como o caso do Mali, são manifestações de situações insustentáveis já existentes e reconhecidas internamente há algum tempo.

O mesmo é válido para situações como a Guiné-Bissau onde, à semelhança de outros países, o problema da qualidade da liderança política exige um processo de diálogo inclusivo e extensivo à sociedade. No caso da Guiné-Bissau, da Serra Leoa ou da Guiné-Conakri, as dinâmicas internas são agravadas pela influência do tráfico de droga, que é incomparavelmente maior do que a intervenção e o interesse da comunidade internacional na zona. Estes negócios movimentam grandes montantes financeiros, que não conseguem ser contrabalançados pelos orçamentos dos governos dos países africanos ou pelo apoio dos doadores. Frequentemente, a comunidade internacional tende a cometer o erro de investir em soluções militares para problemas de natureza política.

Na zona geopolítica do Sahel, salienta-se também o domínio das rotas comerciais pela criminalidade organizada, em que o extremismo, o terrorismo ou a classificação como “jihadistas” acaba por ser útil para dar a estes grupos acesso a novos financiamentos. Tal está ligado a rápidas transformações ao nível cultural e identitário em vários destes países, uma vez que a nova geração consegue gerar mais rendimento pelo recurso a atividades criminosas, do que os seus antecessores que se dedicam a atividades tradicionais. As previsões para o futuro não são animadoras, uma vez que se prevê que a população do Sahel mais que duplique nos próximos 25 anos, ao que se junta uma descida da capacidade de produção de alimentos e o avanço do deserto para sul, em resultado das alterações climáticas.

No contexto continental, o otimismo gerado em torno de África nos últimos anos deriva, em grande parte, do boom dos recursos. No entanto, levanta-se a questão essencial da forma como se gerem esses recursos, quem deles beneficia e como são utilizadas as receitas desses recursos. Por um lado, são necessárias lideranças internas, que centrem as suas ações numa visão de longo prazo e em prol das suas populações. Por outro lado, os próprios parceiros internacionais não deverão olhar o continente apenas na ótica de comércio ou de extração de recursos, mas investir nas infraestruturas e nos recursos humanos, que permitam reforçar capacidades e implementar estratégias de longo prazo.

Foram ainda abordadas as diferenças nos países que passam atualmente pelas chamadas “Primaveras Árabes”, incluindo o Egito, a Tunísia e a Líbia.

O relatório do debate estará brevemente disponível.

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