Da sustentabilidade à segurança, das reconfigurações geoeconómicas ao comércio, das crises da União Europeia ao papel de Portugal, foi assim a 2ª Conferência de Lisboa que se desenrolou ao longo de dois dias de debates e reflexões sobre a Globalização do Desenvolvimento, tendo contado com mais de 30 oradores de 4 continentes e quase 600 participantes.

As Conferências ofereceram este ano, mais uma vez, uma agenda rica em temas atuais ligados ao Desenvolvimento, pretendendo consolidar uma imagem de Lisboa atenta ao que se passa no mundo e procurando intervir na modelação dos grandes acontecimentos que marcam a cena internacional. O programa da conferência e os debates realizados refletem a inevitabilidade da interdependência e da interação entre os fenómenos, desde a realidade geopolítica, a globalização, as crises, os efeitos nas relações do homem com a sociedade, a organização dos sistemas políticos e a governação, ou as questões de natureza económica.

A importância de uma ação internacional mais centrada nas pessoas e na sustentabilidade foi salientada no primeiro painel. Com efeito, as desigualdades, especialmente a diferença nos rendimentos das pessoas estão no centro dos problemas do desenvolvimento global, e continua a ser determinante o investimento na educação (não só ligada ao desenvolvimento humano, mas também ao crescimento económico, uma vez que é necessária mão-de-obra que possa competir na nova economia global, na economia do conhecimento e na alta tecnologia). Foi reconhecida a maior abrangência e poder transformador da nova Agenda 2030, mas também os grandes desafios à sua implementação. A necessidade de proteção dos mais vulneráveis, de promover a globalização da dignidade, de investir na felicidade dos povos e de erradicar a pobreza assumem-se como urgências (possíveis) que exigem vontade política e também alterações na governação global.

Na tarde do primeiro dia, as sessões sobre as reconfigurações económicas e sobre o ressurgimento do bilateralismo e do protecionismo traçaram, por um lado, algumas das megatendências económicas para os próximos anos e, por outro lado, alguns dos fatores positivos e negativos que se perspetivam na negociação dos acordos comerciais, com impactos consideráveis nos países em desenvolvimento. A forma como a crise económica tem afetado as economias e as mudanças que se perspetivam nas políticas dos Estados Unidos e da China estiveram também em debate.

As dinâmicas e possibilidades de crescimento nos países em desenvolvimento foram abordadas no início do segundo dia da Conferência, com apresentações sobre a Ásia, a África e a América Latina. Para além do esbatimento da dicotomia Norte-Sul, ficaram patentes grandes diferenças dentro do “Sul”. Em comum, o facto de os países fortemente dependentes na exportação de matérias-primas e cujas economias não são diversificadas estarem a sofrer os efeitos da queda dos preços, principalmente por não se ter assegurado a poupança e a transformação das economias durante o ‘boom’ de dez anos.

A sessão sobre a globalização das ameaças de segurança suscitou grande interesse, tendo analisado a interligação entre globalização e conflitos, bem como a conjuntura atual relativa aos fenómenos do terrorismo em geral e do autodenominado Estado Islâmico em particular. Foi constatado que não haverá segurança sem um continente africano mais estável, embora a comunidade internacional pareça negligenciar esse facto, dada a pouca importância geoestratégica que confere a África. A complexidade das ameaças de segurança (e das respostas necessárias) ficou patente no debate, nomeadamente no que respeita à relação entre terrorismo e religião ou às dinâmicas geopolíticas do Médio Oriente.

A sessão sobre os desafios que se colocam ao projeto europeu salientou o momento particularmente difícil que a União Europeia atravessa, com uma convergência de complicações que tem conduzido a soluções e opções que, em vez de resolverem, parecem acrescer mais problemas aos já existentes. A multiplicidade de crises – a crise económica, a crise na Ucrânia, o inferno na Síria, a crise dos refugiados e a possibilidade da saída do Reino Unido, a ascensão de populismos – é uma realidade que nos alerta para esse momento de encruzilhada, em que os valores que presidiram à criação do projeto europeu se encontram ameaçados. O défice de lideranças na União Europeia, a disfuncionalidade política na Europa e a disfunção do sistema de decisão na UE não são compatíveis com moeda comum, nem com Schengen, segundo algumas perspetivas.

Tal foi também salientado na mesa redonda de debate sobre o papel de Lisboa na globalização, onde três antigos ministros dos negócios estrangeiros enfatizaram a necessidade de Portugal assumir um protagonismo mais ativo enquanto facilitador de consensos e assim dar o seu contributo para o reequilíbrio do sistema internacional, aproveitando “um capital de simpatia internacional que é superior à dimensão geográfica”.

Nesta sessão, foi ainda lançado o Clube de Lisboa, para o qual são convidados para membros os participantes das diversas edições das Conferências. Esta iniciativa terá um Conselho Consultivo Estratégico, composto por personalidades nacionais e internacionais reputadas, o qual ajudará a lançar pontes de diálogo e entendimento global.

A iniciativa do projeto das Conferências de Lisboa é de um grupo de entidades que inclui a Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa (CCIP), a Câmara Municipal de Lisboa (CML), a Fundação Portugal-África (FPA), o Instituto Marquês de Valle Flôr (IMVF), o ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa, a Sociedade de Financiamento do Desenvolvimento (SOFID) e a União das Cidades Capitais de Língua Portuguesa (UCCLA) e Fundação Calouste Gulbenkian (FCG) como anfitriã do evento.

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